*Márcio Amêndola
O primeiro turno nas eleições trouxe à luz um problema recorrente na política brasileira: a (quase) total ausência do debate político, e a luta suja, de subsolo, substituindo propostas, balanços da ação dos agentes públicos já testados em cargos públicos, entre outras agendas positivas.
Sobre os candidatos excluídos deste primeiro round, Plínio de Arruda Sampaio, figura emblemática da esquerda nacional, articulador do primeiro grande projeto de reforma agrária inscrito no século XX neste País, obteve uma exposição midiática sem precedentes. As reflexões do candidato, por vezes, foram usadas pelos setores mais conservadores para atacar o PT e sua candidata. Setores da esquerda excluídos dos debates na TV acusaram o Psol de ser ‘usado’ como contraponto para os ataques ao governo Lula, numa espécie de ‘massa de manobra’ da direita.
Não concordo em absoluto com este ponto de vista de parte da esquerda (PSTU, PCO, por exemplo), já que todo partido que aceita o jogo institucional está sujeito às suas regras e, no caso, o critério de ‘escolha’ da mídia para incluir ou excluir candidatos dos debates, de representação parlamentar ou ‘tamanho’ nos índices de pesquisas, pode até ser questionado, mas a qualquer partido não é dado o direito de abrir mão de espaços para expor seu programa e suas idéias.
Marina Silva, a princípio centrada e bem intencionada, foi aos poucos resvalando para práticas, digamos, mais à direita e ao centro, na medida em que a mídia inflava sua participação no processo eleitoral, sob a inventada ‘onda verde’, no momento em que o candidato ‘escolhido’ pelos jornalões via sua candidatura fazer água. Então, quando Dilma Rousseff foi acusada de apoiar o aborto, quebrar sigilos fiscais, e ter pouca afinidade com a religião, Marina resvalou para o coro dos acusadores, aproveitando sua origem evangélica e pisando no mesmo terreno do pensamento conservador.
Só para citar um dos problemas envolvendo temas polêmicos, a questão do aborto no Brasil é cercada por preconceitos morais, concepções religiosas das mais reacionárias e muita, mas muita hipocrisia. Se dependesse da igreja Católica, meninas de 12, 15 anos estupradas por seus próprios padrastos ou pais, teriam a insana ‘missão’ de sofrer ainda mais e gerar filhos destas situações de violência, sob uma hipócrita falácia de ‘defesa da vida’. A igreja também proíbe seus fiéis de usarem preservativos em relações sexuais, sob o pretexto de que a prática com o uso do acessório seria recreativa, estimulando o sexo sem compromisso. Esta posição tangencia a questão das DSTs (Doenças Sexualmente Transmissíveis). No limite, a Igreja defende, mesmo que indiretamente, a contaminação das pessoas pelo HIV, vírus causador da Aids, uma vez que acaba por estimular o sexo sem proteção, como se fosse possível controlar doenças apenas por um pretenso comportamento moral e ético.
A candidata Dilma Rousseff, favorita para levar a eleição já no primeiro turno, teria sito vítima destes boatos, mas há outros fatores a serem considerados, entre os quais a grande abstenção no Norte e Nordeste – em alguns Estados próxima de 30% – os ataques sistemáticos da grande mídia, a inabilidade do presidente Lula, que ‘exagerou a mão’ na defesa de sua candidata e nos ataques à mídia (que nem precisava de um pretexto para ‘sabotar’ sua candidata, diga-se a verdade), e a própria dinâmica do processo eleitoral no Brasil, onde o debate político é substituído por temas menores, empurrando o eleitor para a decisão em cima da hora, a poucos passos da urna eletrônica.
Com a cabeça em dúvida, o eleitor tendeu a votar em branco, nulo, ou simplesmente não comparecer ao local de votação. Some-se a isto as lambanças do nosso respeitável STF (Supremo Tribunal Federal), que decidiu, de última hora, que o eleitor teria de votar com um único documento com foto, ‘abolindo’ simbolicamente o Título de Eleitor. Para o cidadão urbano, de classe média, tudo bem, cara pálida. Mas e aquele humilde ribeirinho amazônico, que não possui tal documento com foto, ou aquele nordestino que, sem o título nas mãos (o STF disse em rede nacional que o documento eleitoral não era necessário para votar!), não pôde encontrar seu local de votação? Tudo isto levou o processo eleitoral para o segundo turno.
José Serra até aqui é o grande beneficiário dos percalços eleitorais alheios, pode até dizer que não tem nada a ver com tudo isso, e que, afinal, o segundo turno é saudável para o debate político. Certo, mas bem que ele poderia já no primeiro turno perder mais de seu precioso tempo para apresentar seu programa para o País (o ‘plano de governo’ do tucano ainda não estava disponível aos cidadãos a menos de uma semana das eleições), ao invés de acusar Dilma de ‘quebrar o sigilo’ de sua filha, quando, na verdade, isto não aconteceu.
De qualquer modo, o caráter plebiscitário destas eleições finalmente se confirma. De um lado, a continuidade do projeto político iniciado pelo presidente Lula, desde a ‘Carta aos Brasileiros’, quando o PT demonstrou que não iria ‘incendiar’ o País – e não o incendiou, muito pelo contrário – e de outro lado, a oposição, que agrega cada vez mais componentes do campo conservador, ao estilo da velha UDN (aquela que conspirou contra Getúlio Vargas, Juscelino e, finalmente, contra Jango Goulart), não que não haja representantes conservadores também do ‘outro lado da cerca’ petista.
Os eleitores dirão, no dia 31 de outubro, se querem a continuidade do governo do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, representado por sua candidata, Dilma Rousseff, ou se desejam uma guinada em outra direção, que coloque José serra no comando da 8ª maior economia do mundo.
Opino.
Dilma Rousseff, neste momento, representa, para nós, do Fato Expresso a opção possível para que o País não desande, continue com um Estado forte (porque a Globo fala tão mal da presença do Estado na vida das pessoas e da economia? Justo a Globo, que defende amplos setores da sociedade brasileira, entre a Avenida Cidade Jardim e o Bairro do Leblon?), um país onde não haja mais FOME, onde as desigualdades sociais sejam reduzidas, onde seja possível uma reforma agrária para a produção de alimentos, onde as empresas estatais não sejam privatizadas de graça, entregando-se o patrimônio nacional a interesses particulares. Um País que não viva de beijar o anel dos EUA e dos Europeus, um País que gere, nos próximos anos, mais 14 milhões de empregos, como de fato, já gerou. Um País respeitado no cenário mundial, enfim, e que cuide das pessoas que aqui vivem, não apenas com palavras, mas com ações concretas, como de fato vem acontecendo, a nosso ver.
Só para dar um exemplo, os EUA e a Europa exploram petróleo no mar, em águas da Guiné Equatorial, na África. O país DONO DAS RESERVAS DE PETRÓLEO fica com 12% dos lucros, enquanto que EUA e Europa ficam com mais de 60%, e o restante vai para as empresas operadoras do sistema, todas internacionais. É este modelo de gestão que os tucanos querem implantar neste país? Vamos vender nossa maior companhia e rebatizá-la de ‘Petrobrax’ como sonhou FHC, agora pelas mãos de seu sucessor político, ou vamos dar mais uma oportunidade para o atual governo continuar a aprofundar sua política que afinal, vem mantendo o País nos eixos, sem entreguismos?
Com a palavra, os eleitores.
(*Márcio Amêndola de Oliveira é jornalista e graduando em História pela USP. Autor do livro “Zequinha Barreto, um Revolucionário Brasileiro”, e Coordenador de Documentação Histórica do Instituto Socialismo e Democracia José Campos Barreto).
Márcio! Parabenizo-o pelo retorno do “FATO EXPRESSO”! Obrigada pela Coluna do Tio Marcos também! O véio sempre curtiu muito esse jornal e com certeza você não irá desistir dele tão cedo… BRAVA GENTE BRASILEIRA que constrói esse país!!! SUCESSO PARA TODOS !!!
Márcio, parabéns pela volta do Fato Expresso, você é um guerreiro mesmo. Sinto não compartilhar de todas as suas opiniões, mas sei que você representa o lado autêntico do PT,o qual infelizmente, está alijado do poder real no partido. Grande abraço, Chico.