***Vitor da Trindade
A maioria das pessoas não sabe ou finge não saber da importância de certos órgãos para a comunidade num todo. Imaginam, que uma entidade como o TPST (Teatro Popular Solano Trindade) ou a SEPPIR (Ministério da Igualdade Racial) são somente direcionados a uma parte da sociedade considerada *desprivilegiada*, sem pensar que quando se preenche um lado da balança o equilíbrio e o resultado final vão melhorar a qualidade de vida dos dois lados, e reagir contra o que insatisfaz uns e outros.
Nos dias de hoje, o mundo redescobre as muitas possibilidades culturais, cores, credos e línguas, intercambiando através de muito respeito e entendimento as diferenças entre si. Nós fazemos parte dessas ferramentas, material usado na educação de nossas crianças e jovens, através do que vão aprender com nossos alunos diretos, multiplicadores de nosso trabalho, aumentando a rede de Conhecimento, de compreensão de gestos e linguagens, facilitando a comunicação entre todos.
Esta cultura antes conhecida somente pela forma oral e detida pelos antigos e modernos Griots, (professores, historiadores e mantenedores das tradições afro), como Babalorixás e Yalorixás, Mestres de Bateria, Chefes de Comunidades e outros descendentes de escravos, que receberam esse saber de seus antecessores, hoje, vem na literatura, na tecnologia, na saúde e em todos os setores, abrir concorrência nas Universidades, nos altos cargos administrativos e outros lugares onde a sociedade não via senão uma etnia majoritária, diferentemente do que se pensa, que só estaríamos direcionados em nosso espaço, a trabalhar pela arte em geral.
As lutas em prol da democracia racial, contra o racismo e a intolerância, a luta em busca da compreensão, da necessidade de convivência entre as várias populações étnicas que compreendem o povo brasileiro, não se iniciaram nos dias de hoje, nem em nossa década, nem ao menos no nosso século. Para nós, negros, o ponto de partida foi no momento em que o primeiro Ser Humano escravizado aportou em terras americanas, e percebeu que tudo que lhe haviam tomado, quando capturado em suas terras do outro lado do oceano, tinha que ser preservado, não podia ser esquecido.
Assim, apesar de ter sido considerado objeto, menos importante do que vacas ou galinhas, o escravo conseguiria, contra todas as intempéries, lutar, por sua liberdade, fugindo, matando, ou por quaisquer outras formas de guerrilha, que pudessem servir como resistência, ainda que aparentando rendição, como o disse muito bem nosso querido ex-ministro da cultura Gilberto Passos Gil Moreira.
“A luta continua, companheiros!!!”, fala nosso ex-presidente Lula, que compreendeu muito bem essa mensagem.
Zumbi dos Palmares, Ganga Zumba, Luiza Mahin, Licutan, José do Patrocínio, Castro Alves, João Cândido, Solano Trindade, Bantu Stephen Biko, Lélia Gonzales, Nelson Mandela, Malcolm X, Martin Luther King, e os vivos, Abdias Nascimento, Ele Semog, Matilde Ribeiro, José Cândido e Raquel Trindade, todos esses, um número muito pequeno do grande contingente de todos os nomes que lutaram e lutam contra o racismo, que batalham cotidianamente, para uma real democracia racial, tão pregada por nossos governantes e pela mídia universal. Daí criamos leis de ressarcimento em compensação aos que sofreram injustiças durante o processo civilizatório da humanidade.
O TPST, através do que nos foi ensinado por nossos pais e avós, familia envolvida desde a década de 30 em informar, divulgar e preservar a cultura afro brasileira, ensina a professores e divulgadores culturais, tudo o que sabemos, sobre os orixás, sobre os ritmos e danças do repertório afro, sobre os caminhos dos escravos e seus descendentes, na África hoje e ontem, nas colônias até os dias de hoje, possibilitando criar meios para que esses educadores, divulgadores desta mesma cultura, tanto em obediência às leis de diretrizes básicas da educação, como no apoio ao cotidiano de todo brasileiro, esteja abrindo a consciência de negros e não negros no relacionamento entre as diferenças, no respeito a estas e na melhoria do diálogo entre todos os povos que vivem no nosso planeta, no nosso país e principalmente em nossa cidade.
No futuro, as universidades e escolas terão uma cadeira para a Historia Africana e Afro Brasileira e trabalhos como o nosso, terão cumprido as suas missões de mixar nossa cultura miscigenada.
*Vitor da Trindade tem 54 anos, é compositor e percussionista, tem 04 discos próprios gravados, vencedor do Premio Cultural Petrobras 2005, ex-professor da Landesmusikakademie de Berlin, Groove Zentrum fur Perkussion e Musikschule Schonenberg na Alemanha, já se apresentou em quatro continentes com o trio Revista do Samba, com lançamento do quinto CD, Revista Hortência do Samba, co-produção Brasil-França, previsto para março de 2011 em Marseille, Paris, Berlin e São Paulo. É professor de música e vice-presidente do Teatro Popular Solano Trindade.