**Por Alexandre Oliveira
Não poderia ser diferente. A feira de artes de Embu que tem em sua marca a rica história de ter abrigado figuras como Solano Trindade, o poeta do povo, Cássio M’Boy, autêntico pintor que nos levou para Paris nos anos 1920, a grande artistas plástica Azteca, um dos maiores terracotistas da América Latina, Tadakio Sakai, o precursor da feira, Mestre Assis e outros, já não mais possui influência no mundo voltado às artes e hoje se contenta com os “artesãos” de produtos manufaturados e ornamentos, como cintos de “couro”, para as calças jeans da geração fast-food atual, ou pior, bichinhos de “durepoxi” e outras quinquilharias que cairiam melhor em uma vitrine qualquer da rua 25 de Março.
A falta de estrutura aos poucos e convalescentes turistas que por aqui aportam é o panorama de uma cidade que tenta se valer do seu legado, mas que renega os seus, permitindo que os escassos e brilhantes artistas que nos restaram sofram com as vicissitudes do mundo capitalista e da falta de estrutura para a apresentação de sua arte.
Uma cidade que se diz voltada às artes, mas que somente no final do ano de 2010 concluiu a reforma do Teatro que leva o nome do poeta Solano Trindade [com apoio do governo federal e grande apelo da família Trindade] e que sofre por falta de estrutura, não é cotada no circuito de teatro nacional. Não há apoio realmente efetivo à música, dança e afins, que diversificavam o gênero artesanato da cidade. As pequenas e fracas oficinas (por falta de apoio, e não por força de vontade de seus professores e oficineros) que a nossa prefeitura batizou de núcleos de cultura não dão vazão às necessidade dos munícipes. Um exemplo gritante desta falta de apoio é o melancólico fim do tradicional Coral das Artes, que morreu de inanição em 2010 após quase 20 anos levando o nome de Embu além fronteiras, por falta de incentivo oficial.
O Centro Histórico também não é respeitado nem pelo Poder Público, que construiu uma sinalização equivocada (placas enormes, com textos em português e inglês com erros, e luminárias ‘modernas’ em lugar dos antigos e belos postes coloniais de ferro) e trocou todo o piso de antigos paralelepípedos por modernos briquetes, destoantes da arquitetura histórica colonial, isso só para ficarmos em dois exemplos, sem falar na interminável reforma da Praça da Lagoa que, a cada novo governo é destruída e reconstruída, não conseguindo integrar-se à cidade, a não ser como uma grande ‘garagem’.
Não há preparação de guias turísticos para uma visita planejada, o que permitiria a nossos anfitriões conhecerem os monumentos e as histórias de nossos patronos das artes, para poderem falar de Embu aos visitantes. Nossas escolas não lecionam nossos artístas, não lêem suas poesias, não ensinam sua arte.
Recentemente vi uma foto de meu amigo, o escultor Mário C. Ramos, ministrando uma palestra aos pequenos alunos de uma escola municipal. Como uma espécie de professor, ele se dedicava a ensinar o conteúdo de sua obra, a simbologia de suas esculturas e o amor que tem pela arte. Para muitos isso não é significativo. Infelizmente para os mesmos, Embu ainda é “das Artes”. Perdem mais tempo com discursos e rótulos do que com reais políticas públicas voltadas para o resgate de nossa história, de nossa feira de Artes (com ‘A’ maiúsculo) e geração de emprego e renda naquilo que tínhamos de melhor: nossa criatividade, agora em estado latente.
O Embu que todo mundo quer, e que poucos ainda lembram…
Criticar é fácil. Quando passamos por uma rua esburacada e sentimos o solavanco do carro, logo notamos que a manutenção daquela via não foi realizada e que por este motivo o tempo e a grande quantidade de transito no local a degradou. Nessa proposição nos cabe a diretiva de criticar o poder público que por nossos impostos deveria realizar a manutenção constante, assim como para casos como a falta de esgoto público e outros problemas de ordem social.
Neste caso é diferente. O patrimônio histórico que Embu possui não recai somente sobre os prédios antigos que formam o centro velho, ou a característica da feira de artesanato, que ao longo do tempo perdeu suas raízes. Nossa história também está nos livros, nas artes como as esculturas, e quadros. Nosso patrimônio está descrito em versos, como nas poesias de Solano, e principalmente na memória dos grandes artistas que por aqui passaram, ou estão vivos, mas incapacitados por falta de apoio.
Esse patrimônio imaterial, assim como o material, precisa ser preservado, restaurado e não a atitude desempenhada na troca, reposição, substituição por outros materiais como vem sendo adotado pela administração vigente. Um dos exemplos atuais ocorreu na praça central, o famoso Largo 21 de Abril, onde todos os lustres antigos foram substituídos por novos, ditos “melhores e modernos”. A riqueza na expressividade e na exuberância da arquitetura dos primeiros lustres que iluminavam nossa praça centenária foi simplesmente trocada por novas armações que em nada compõem ou reverenciam a proposição de nossa história. Nossa postura está se equivocando em determinar que o novo seja melhor, que a manutenção é inviável, esquecendo que ela é quem garantiria a preservação das raízes da cidade, do lindo vale que Embu já fora como descreveu Jordão em seu livro sobre esta terra.
Falta-nos a percepção de que não há o incentivo para que a população que reside do outro lado da Regis Bittencourt, dita como “linha divisória” entre o centro e a periferia, possa se inserir na propositura de conhecer e aprender com os artistas que aqui expõem. Não há grupos de leitura, reflexão, estudo sobre a arte e história de Embu. Nossos políticos mal conhecem as vielas que resguardam exuberantes traços da arquitetura barroca provindas do colonialismo português com os jesuítas, e nossas crianças, particularmente da periferia, não raro, jamais visitaram o centro de Embu ou sequer tiveram a chance de conhecer nossa arte, nosso patrimônio histórico.
Nessa intenção do resguardo e restauração de nossas raízes, Embu poderia criar um mercadão das artes, como ocorre nas cidades turísticas de Recife e Salvador. Para o aprendizado daqueles que buscam seu primeiro emprego, poderia haver com artistas selecionados oficinas de arte-artesanato, workshops, dias especiais de incentivo aos munícipes em aprenderem um ofício de artesanato, permitindo assim a disseminação da cultura e do ofício de ser artesão, particularmente para aqueles que buscam uma alternativa de emprego e renda.
Com a necessidade de recepção a grupos de turistas para visitas assessoradas, nossa cidade poderia disponibilizar cursos técnicos [públicos] de línguas, como inglês, francês e espanhol, capacitando jovens e adultos a se tornarem guias turísticos e propagadores da legítima história embuense aos visitantes estrangeiros ou de outras cidades do Brasil, além de resguardar o conhecimento e a importância do patrimônio histórico de Embu.
Nossa cidade não tem memória. Não possuímos um museu para a celebração de nossas origens e manutenção de nossos acervos. Não obstante, grande parte de objetos que contam com o estigma do tempo foram jogados no lixo, assim como os paralelepípedos datados de 1600 trazidos a navio de Portugal que na praça davam o tom bucólico do centro.
A Cultura como uma política pública e um direito constitucional dos cidadãos deveria possuir maior credibilidade e espaço no governo, não sendo somente moeda de troca para partidos políticos e seus assessores sem conhecimento técnico ou proximidade com a cultura local. Artistas deveriam ter voz ativa na área cultural do governo, pois são eles os protagonistas de nossa história.
42 anos de história fez nossa feira de artes, mas a Arte está presente em nosso seio há 452 anos, na influência jesuítica, na arte indígena mesclada com a devoção cristã, presente até hoje em nosso Museu de Arte Sacra. Mas o que vemos dia a dia é cada vez mais, uma sociedade de espetáculo, ‘eventos culturais’ em lugar do ‘fazer cultura’, história e memória.
Embu celebra o seu esquecimento. E, como diria o mestre Assis: “Até quando, margarida? Até quando?”
** Alexandre Oliveira é jornalista formado pela Faculdade Paulus de Tecnologia e Comunicação – FAPCOM. Foi repórter do Jornal Folha de Embu. Na internet, atuou como colaborador dos sites O taboanense e Embu Digital. Foi estagiário/assessor da Câmara Municipal de Embu das Artes. Passou pela assessoria da Fundação Casa (Antiga FEBEM). Atualmente é repórter e desenvolvedor do site FATO EXPRESSO, do jornalista Márcio Amêndola.
É…a “feira das Artes” não existe mais…o que tem é a “feira do Industrianato”, com total apoio dos mandantes.
Gente despreparada, sem conhecimentos de Cultura e Turismo, mas com cacife politicó. Cultura e Turismo é coisa séria, e a maior fonte de divisas nos Paises desenvolvidos. Enquanto isso, nossos Artistas deixam a Cidade, cuja fama ajudaram a criar. “Coral das Artes” ? Prefere-se contratar grupos de fora. É triste !