Allan Robert P. J.
Tenho a impressão de que cada ser humano sonha com os quinze minutos de fama decretados por Andy Warhol. O problema começa com o tempo, que não seria suficiente para todos. Nem as pessoas se contentariam com o breve quarto de hora: querem mais. Querem sempre mais. Mas o título desta carta pode induzir alguém ao erro: não me refiro ao aspone do órgão público que age como assessor de Deus, nem ao suplente de vereador do vilarejo que acredita ser o chefe do aspone, não. Estou me referindo a quem, que de um modo ou de outro, acaba virando notícia de jornal, como o Chapman que matou Lennon para ficar famoso.
“Ela vivia olhando para o chão. Procurava dinheiro. Muita gente pensava que ela era louca, mas quem a conhecia sabia que ela ficara assim de tanto procurar. Às vezes encontrava moedas, ou alguma nota de pequeno valor. E ficava com raiva: queria achar a grande bolada que mudaria a sua vida, dentro de um envelope pardo. Chegaram a dar queixa e eu tive que levá-la à delegacia algumas vezes. Essa gente tem medo de tudo que é diferente. Não sabem tomar conta da própria vida e preferem julgar pelo padrão estabelecido por eles.
Ela não era perigosa nem nada, apenas passava o dia procurando dinheiro pelo chão. Ou nos beirais de janelas, sobre as latas de lixo, muretas, cantinho de calçada. Ela nem precisava, a aposentadoria deixada pelo marido permitia-lhe uma vida tranqüila, até com um certo conforto. Mas ela queria a sua loteria pessoal.
Em dias de feira olha ela lá, desde as cinco da manhã. Vasculhava tudo com os olhos, não tocava em nada. Às vezes seguia alguém que acabara de sair de um banco, sempre esperando que caísse um grosso envelope. E eu tive que explicar que ela teria que devolver, caso acontecesse. Mas ela já não ouvia ninguém. Só chorava quando os meninos a chamavam de Dona da Esmola: ela não aceitava esmolas.
Muitos pensavam que ela era surda, e que foi por isso que não ouviu o trem chegando, mas eu sei que foi suicídio. Depois da notícia da mulher que achou e devolveu quinhentos euros, ela mudou, passou a ficar mal-humorada. Semanas depois, quando a televisão noticiou que um homem achou e também devolveu mais de noventa mil euros, ela perdeu a expressão. Não sorria mais aquele sorriso tímido quando pedia café com brioche no bar da praça, não ouvia mais os meninos que a perseguiam à saída da escola, parou até de olhar para o chão. Foi quando falei com o comandante que deveríamos levá-la para a clínica, e fomos achá-la no trilho do trem. Era tarde.”
São pessoas que aspiram algo, mas não sabem como alcançá-lo. Ou pessoas normais, como o vizinho gentil, que um dia explode e vira notícia. Depois, desaparecem como bolhas de sabão e delas ninguém mais ouve falar.
Lembram da história da torcedora no caso do rojão que não chegou a atingir o Rojas, goleiro do Chile, no jogo que acabou afastando a seleção chilena de torneios por algum tempo? Pois é, aqui na Itália tem um monte de casos parecidos. Será que alguma TV compraria a idéia de um programa chamado “Quinze Minutos”? Matéria é que não iria faltar. O único risco seria o programa durar, também ele, apenas quinze minutos. Warhol profético?
**Allan Robert P. J., carioca de nascimento, tem 51 anos, viveu em Embu (SP) por quase duas décadas e lá se casou com Eloá, em 1987. Mudou para Salvador (BA) onde estudou Economia e o casal teve duas filhas. De lá, foram para a Itália, onde vivem atualmente. Allan é micro empresário do ramo automotivo, e Eloá trabalha no ramo de alimentação. Ambos têm raízes (amigos e parentes) na ‘ponte’ Embu-Assis-SP. Allan é irmão dos advogados Bruce P. J. e Dawidson P. J., radicados em Embu. Dawidson já foi do primeiro escalão da Assessoria Jurídica da Prefeitura de Embu no governo Geraldo Puccini Junior (1993-96), e ambos já participaram da diretoria da subsecção da OAB de Embu”.