*Flávio Aguiar
No domingo passado (9) o Partido Socialista Francês realizou o primeiro turno de sua prévia eleitoral para determinar quem será o(a) candidato(a) à presidência no ano que vem. Entre os mais votados, não houve surpresas. François Hollande, do centro do partido, obteve 39% dos votos, e Martine Aubry, cobrindo um espectro à centro-esquerda, 31%.
Mas houve duas grandes surpresas: o 3º colocado foi Arnaud Montebourg, da esquerda do partido, com 17%. E o comparecimento dos votantes superou quase pelo dobro a expectativa dos próprios socialistas. Esperava-se um milhão, compareceram dois.
O segundo turno se realiza no domingo que vem. Montebourg e os que o apoiaram ou nele votaram serão o fiel da balança e, penso, eles se inclinarão mais para Aubry do que para Hollande. A direita do partido, que ficou pouco além dos 6%, vai apoiar Hollande, o que pode lhe ser incômodo, pois ele teria que atrair votantes de Montebourg.
Hollande encarna a imagem do político sério e confiável, de bom humor, o que pode lhe valer pontos diante das “excentricidades” de Sarkozy. Aubry, prefeita de Lille, encarna a idéia da administração competente e, agora, a sua junção, provavelmente, com um empenho mais crítico em relação às políticas hegemônicas no “Consenso de Bruxelas” europeu.
Estaremos diante de uma vaga nova, em direção à esquerda, dentro da própria “esquerda européia”? Poderá ela recuperar o contato com os ideais de uma social democracia avançada (para dizer o mínimo) que a maior parte dos partidos dessa corrente perdeu? Pode ser, mas a julgar pelos números da votação, a recuperação desse contato ainda será tímida num primeiro momento.
Pode ser que ele seja acelerado pelo desembarque na Europa (a começar por Londres) das práticas do movimento Occupy Wall Street. Movimentos londrinos estão prometendo ocupar alguma área pública próxima da City (centro financeiro) nos moldes do que fizeram os militantes norte-americanos em Nova Iorque, num movimento que, de diferentes formas, já se espalhou por quase uma centena de cidades nos EUA.
O Occupy Wall Street, copiando práticas dos países da Liga Árabe, em especial do Egito na praça Tahir, conseguiu inovar pela permanência num lugar fixo. Em muitas cidades da Europa ou mesmo dos EUA, já ocorriam há algum tempo movimentações massivas criticando a débâcle que a desregulamentação financeira e do trabalho (é bom não esquecer) provocou.
Só em Washington, não faz muito, 100 mil pessoas se congregaram para tanto. Mas esse tipo de manifestação, sobretudo para a mídia convencional que as vê como “coisa do passado”, vai assim como vem: assim que ela se dissolve, fica aquele clima de “e o vento levou…”
Mas a ocupação pacífica não: se ela evita o confronto com a polícia, ela adquire uma sobrevida e vai atraindo cada vez mais gente. Se, eventualmente, vem o confronto com a polícia, como ocorreu em Nova Iorque, ela reforça o movimento, porque ela se dirige também contra os “pacíficos”.
Aqui na Europa muitas vezes manifestações ruidosas e momentâneas chamam os “Caóticos” ou “Autônomos”, que se vestem invariavelmente de preto, e vêm direto para o confronto. O resultado é que, na mídia, muitas vezes, apenas eles obtêm destaque, porque isso sempre chama a atenção e, para a sua face mais conservadora, isso ajuda a desacreditar os movimentos. Com algo do tipo Occupy Wall Street isso fica mais difícil, embora possa ocorrer também.
Dia 15 – na véspera da prévia socialista francesa – estão previstas manifestações contra o mundo financeiro em várias cidades européias. A prévia, portanto, vai se dar num clima de possível “esquentamento” da participação dos jovens e daquela recuperação de um espírito social-democrata e/ou socialista mais avançado. Pode ser. Cruzemos os dedos.
P. S. Segolène Royal teve uma baixa votação no primeiro turno. Parece que saiu chorando da apuração. Para mim ainda fica o mistério de esclarecer o porquê desta sua tão radical queda de popularidade. Uma pena.
(Por: Flavio Aguiar, para a Rede Brasil Atual)