Tema, no entanto, sequer foi lembrado pelo novo presidente da Câmara em seu discurso; relator almeja aprovação já no primeiro semestre
Brasília – Concluído o processo de escolha do novo presidente da Câmara, com a eleição hoje (4) do deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), o PT, com o apoio da maior parte dos deputados dos partidos da base aliada, tentará finalmente emplacar o projeto de reforma política. A ideia é aproveitar o momento de força política do aliado recém-eleito para aprovar ainda no primeiro semestre uma reforma que não será ampla, mas conterá um ponto considerado fundamental: o fim do financiamento privado das campanhas eleitorais. Durante a campanha, Alves se comprometeu com o PT a fazer avançar essa agenda, e agora os petistas pretendem cobrar o cumprimento do compromisso.
O deputado e ex-ministro Nilmário Miranda (PT-MG) destaca o compromisso assumido por Henrique Alves em relação à reforma política e diz “esperar que esse acordo seja cumprido” ainda em 2013. “Essa é a pauta central este ano. Se for aprovada, será um passo enorme para a democracia e para a sociedade no Brasil. É fundamental aprovar o financiamento público, mudar o sistema de voto e avançar no processo de reforma. Esse não é o único passo, existem outros, mas é importante para a nossa democracia”, diz.
Relator do projeto de reforma política na Câmara, Henrique Fontana (PT-RS) promete empenho total pela sua aprovação. “Vou retomar esse tema com muita força ainda no primeiro semestre. Vou imediatamente sentar com o presidente eleito da Câmara para pedir pauta prioritária para a reforma política.”
Fontana não teme novo fracasso na tentativa de aprovar a reforma. “Vamos saber enxugar os pontos como está no relatório que eu apresentei no ano passado, quando fizemos uma última tentativa de votar”, observa. “As prioridades são: financiamento público exclusivo de campanha, teto de gastos com forte redução dos custos de campanha, o fim da coligação proporcional para dar mais nitidez aos partidos políticos e a adoção de diversos mecanismos para o fortalecimento programático e a democratização interna dos partidos.”
Outro ponto importante será a coincidência de eleições. “No mesmo ano, mas não em uma mesma data. O país pode realizar o seu processo democrático ao longo de seis meses, por exemplo, onde a eleição presidencial ficaria separada por dois meses e meio da eleição para prefeitos e vereadores. A única dúvida, que precisamos discutir melhor, é se a eleição para governadores, deputados e senadores se realizaria junto com a eleição presidencial ou com a outra. Todas as eleições ocorreriam no mesmo semestre, com um lapso máximo de 90 dias”, adianta Fontana.
Ruptura democrática
A reforma política, afirma o parlamentar, é uma urgente necessidade do país. “Todas as evidências dos últimos 20 anos na política brasileira deram centenas de demonstrações, milhares de exemplos do quanto o país precisa mudar o seu sistema político. Se nós continuarmos com a lógica que às vezes alguns analistas propõem, se vamos criminalizando a política pouco a pouco, tratando de casos isolados – e, que muitas vezes, merecem punições exemplares por irregularidades cometidas – nós vamos desembocar em uma política totalmente deslegitimada perante a população, em um processo exponencial de criminalização generalizada contra a política. Isso é a antessala de uma ruptura democrática e este seria o maior prejuízo que o Brasil poderia ter.”
Para Ivan Valente (PSOL-SP), só a reforma política pode trazer uma mudança qualitativa para a política e os políticos brasileiros. “Eu entendo que nós temos um desafio. Se não houver uma reforma política, nós vamos continuar tendo todos os escândalos de corrupção e desmoralização da casa. Se não se vota o fim do financiamento privado de campanha, com aumento da participação popular através de plebiscitos, referendos e emendas populares”, diz.
Com os deputados que têm, acrescenta Valente, a Câmara corre o risco de se descolar cada vez mais da realidade popular. “Os grandes temas nacionais não vêm à baila, inclusive aqueles do interesse dos trabalhadores, como o fim do fator previdenciário, a semana de 40 horas e assim por diante. Se não houver a reforma, nós vamos ter a mesmice, vamos continuar aqui com uma pauta que interessa ao capital financeiro e a gerenciar a crise sob o ponto de vista dos grandes monopólios do Brasil”, afirma.
Dificuldade
Apesar da vontade de alguns deputados, a realidade pode ser outra. Integrante da comissão da reforma política criada na Câmara há dois anos, o deputado e ex-prefeito de Recife João Paulo Lima e Silva (PT-PE) diz que “a bem da verdade não tem esperança nenhuma” de que a reforma seja votada. “Acredito que não há um clima para votar e que existe um distanciamento muito grande entre o Congresso Nacional e o eleitor, o cidadão. Não existe um ambiente aqui dentro da maioria para votar, a não ser que haja uma mudança significativa no quadro da política.”
O deputado Paulo Pereira da Silva, o Paulinho (PDT-SP), presidente da Força Sindical, por sua vez, diz acreditar na costura de um acordo que permita a aprovação da reforma. “Uma grande reforma política é complicado de se fazer, mas acho que em alguns pontos é possível avançar. O financiamento público de campanha, por exemplo, é uma questão que precisamos tratar com urgência porque ninguém agüenta mais o financiamento na forma como ele é feito nas campanhas.”
Em todo caso, o primeiro dia da segunda metade da atual legislatura já deu indícios de que a aprovação da reforma política não será tarefa simples. Apesar do compromisso assumido com parlamentares petistas, Henrique Alves sequer citou o tema em seu longo e veemente discurso de vitória. O novo presidente da Câmara falou sobre a relação com o Judiciário, a análise dos vetos presidenciais e a questão dos royalties, entre outros temas. Fez críticas ao excesso de medidas provisórias do Executivo, à grande imprensa e até à TV Câmara. A reforma política, no entanto, não foi lembrada pelo deputado.
Por: Maurício Thuswohl, da Rede Brasil Atual