Caros e Caras,
Paz e saúde!
Se o caos é a confusão geral dos elementos antes da criação do Universo, bem, então está para nascer uma nova realidade italiana. “Nova” e “realidade” em sentido metafórico, já que qualquer que seja o resultado do vácuo político em que se encontra a Itália, os personagens responsáveis pelo futuro governo não terão nem trarão nada de novo. O dos líderes é conhecido por todos. Berlusconi é a gafe internacional em pessoa; Grillo é um ácido cômico mais apreciado pelo conteúdo que pela forma indignada com que faz rir; Bersani e Renzi eram conhecidos antes mesmo da vida política. O jovem Renzi participou de um programa de tv muito conhecido na época, ganhando como prêmio 48 milhões de liras; Bersani ficou famoso em Bettola, sua cidade natal, quando, ainda menino, comandou uma greve dos coroinhas locais, por não concordar com o destino decidido pelo padre às ofertas dos fieis.
Desde 1994, nenhum governo italiano conseguiu completar o mandato para o qual foi eleito. As eleições de 24 e 25 de Fevereiro passado serviram somente para demonstrar – mais uma vez – que o atual sistema político não funciona. Tentando coalizar para vencer, sem se importar com detalhes como ideologia política ou projeto de governo, o resultado é que na primeira dor de barriga o governo cai. O último governo de esquerda de Romano Prodi (2006 a 2008) caiu após o vingativo Prodi deixar fritar o ministro da justiça Clemente Mastella – que já tinha sido ministro do governo de direita de Berlusconi, de 1994 a 1995. A última experiência de Silvio Berlusconi como primeiro ministro (2008 a 2011) já começou mal, quando a sopa azedou entre ele e o presidente da Câmara dos Deputados (além de co-fundador do partido de Berlusconi e ex-fiel aliado) Gianfranco Fini. Nem mesmo o purgante governo técnico de Mario Monti, apoiado pela esquerda do PD (Partido Democrático) e pela direita do PDL (Povo da Liberdade), resolveu. Urge modificar o atual modelo político, mas não existe um parlamento para debater, elaborar e desenvolver um novo modelo. Nenhum partido alcançou a maioria necessária para formar um novo governo. As saídas seriam três: uma coalizão de partidos inimigos, mas o falimento do governo Mario Monti deixou claro que o caminho é inviável; novas eleições, mas com o atual modelo político corre-se o risco da situação se repetir, caso os candidatos sejam os mesmos; uma intervenção do presidente da república, como aconteceu na criação do governo Monti, mas não existe um presidente da república para mediar tentar resolver a situação: Giorgio Napolitano concluiu o seu mandato e já avisou que ficará de fora.
O PD morreu, implodiu. As diversas facções internas colidiram, começam a divergir e o projeto de uma grande união de centro-esquerda deixa de ser sonho para tornar-se utopia. Na eleições internas do partido para a escolha do candidato a primeiro-ministro, já tinha ficado clara a cisão, protagonizada por Pierluigi Bersani, ex-PCI (Partido Comunista Italiano) e Matteo Renzi, ex-DL (Democracia e Liberdade, também conhecido como “La Margherita”, partido de centro moderado italiano). A demolição do PDL de Berlusconi começou alguns anos antes, com a saída de Fini e outros ex-aliados, o que não chega a ser uma surpresa, considerando o apoio solicitado e recebido da Liga do Norte nos últimos anos, partido separatista franco atirador, pronto a aliar-se com o poder, qualquer que seja ele. Foi esse cenário a propiciar o nascimento do M5S (Movimento 5 Estrelas), comandado pelo cômico e ativista Beppe Grillo e por Gianroberto Casaleggio, empresário e ex-Força Itália (partido de direita fundado por Berlusconi). Grillo e Casaleggio não se candidataram a nenhum cargo, mas comandaram a agitação antipolítica pré-eleitoral. Com Casaleggio nos bastidores e Grillo sob os holofotes, o resultado é que o M5S tornou-se o primeiro partido na Câmara dos Deputados. Grillo gritou de uma praça pública aos velhos políticos, poucos dias antes das eleições: “Saiam com as mãos para o alto e ninguém lhes fará mal. Rendam-se! Vocês estão cercados pelo povo italiano…” Mas até mesmo Grillo sucumbiu. O candidato à Presidência da República do M5S é Stefano Rodotà, do partido Esquerda Independente e político de longa data, após a renúncia da jornalista Milena Gabanelli e do médico e filântropo, fundador da entidade Emergency, Gino Strada.
Para compreender o caos criado e mantido pela classe política italiana, é necessário conhecer profundamente a alma desse povo. Dou uma pista: Em 1932 o jornalista alemão Emilio Ludwig viveu por aqui durante seis meses, enquanto escrevia um livro sobre a Itália e os italianos. Certa vez foi entrevistar Mussolini e perguntou: “Mas deve ser bem difícil governar gente assim individualista e anárquica como os italianos!” Mussolini respondeu-lhe: “Difícil nada. É simplesmente inútil!”
Caos, quer dizer, Ciao,
UP DATE:
No início da tarde deste sábado, 20 de Abril, Giorgio Napolitano aceitou se recandidatar à presidência, sob forte pressão da esquerda e da direita. Atual e reeleito presidente, Napolitano é membro histórico do PCI, onde ingressou em 1945. Aos 87 anos e com 60 anos de parlamento, sete dos quais como Presidente da República Italiana, ele bem que tentou convencer que já havia contribuído o suficiente, mas depois de oito dias de uma convulsão institucional que ameaçava não ter fim, sucumbiu.
Foi reeleito com 738 votos dos 997 parlamentares, 343 votos a mais que o último candidato, Romano Prodi. Bastariam 504 votos, mas nenhum dos demais candidatos alcançou o quorum, nas eleições anteriores. Nem a eleição do Papa contou com tantos candidadtos e tentativas. Mas a fumaça branca que saiu de Montecitorio, a sede da Câmara dos Deputados, envenenou de vez a relação entre as diversas facções e partidos. Aguardam-se desdobramentos que deverão sacudir os alicerces da política italiana, mas ao menos alguém tomará as rédeas do poder e dará um rumo ao governo. Só espero que a fase Monti tenha ensinado que o país precisa de um governo político, abandonando de vez a experiência técnica.
**Allan Robert P. J., carioca de nascimento, tem 51 anos, viveu em Embu (SP) por quase duas décadas e lá se casou com Eloá, em 1987. Mudou para Salvador (BA) onde estudou Economia e o casal teve duas filhas. De lá, foram para a Itália, onde vivem atualmente. Allan é micro empresário do ramo automotivo, e Eloá trabalha no ramo de alimentação. Ambos têm raízes (amigos e parentes) na ‘ponte’ Embu-Assis-SP. Allan é irmão dos advogados Bruce P. J. e Dawidson P. J., radicados em Embu. Dawidson já foi do primeiro escalão da Assessoria Jurídica da Prefeitura de Embu no governo Geraldo Puccini Junior (1993-96), e ambos já participaram da diretoria da subsecção da OAB de Embu”.