Em depoimento à CPI dos Transportes, consultor explicou que repasse às permissionárias é muito inferior ao das empresas, embora transportem mais passageiros. Vereadores vão pedir mudança
por Rodrigo Gomes, da RBA
São Paulo – O consultor financeiro do Sindlotação, que representa os trabalhadores das 13 cooperativas permissionárias do transporte coletivo em São Paulo, Levi de Araújo, afirmou hoje (5) que as empresas não conseguirão se manter ativas por mais do que seis meses se os valores repassados a elas por passageiro transportado não forem revisto pela prefeitura. A declaração foi dada em audiência na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre o transporte coletivo da capital, realizada na Câmara Municipal.
Hoje as lotações recebem, em média, R$ 1,47 por passageiro transportado, enquanto as empresas concessionárias ganham R$ 2,35. “A permissão precisa de um reajuste de cerca de 20% no valor de repasse atual, do contrário haverá problemas no sistema”, afirmou Araújo.
Segundo Araújo, a principal dificuldade é a adequação das cooperativas ao Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) firmado no mês de agosto com o Ministério Público do Trabalho, exigindo que todos os trabalhadores que atuam nas lotações sejam os próprios donos ou funcionários registrados. As cooperativas têm até outubro do ano que vem para registrar 100% do quadro.
Araújo ponderou que a apresentação do problema não se dirige a criticar o termo, mas as condições de remuneração. “Não se deixou de registrar o trabalhador porque se quis. Mas porque o sistema não compreende essa remuneração. É diferente a forma de remunerar o trabalhador nas concessionárias e nas permissionárias. O nosso Fator de Utilização sobre mão de obra é bem inferior ao das empresas”, explicou.
O Fator de Utilização (FA) é uma forma de calcular o valor que a São Paulo Transporte (SPTrans) deve repassar a cada empresa ou cooperativa para manter os veículos em operação, em relação a cada item da planilha de custos: mão de obra, pneus e diesel, por exemplo. Esse valor é estimado com base em dados fornecidos por cada operador ou levantados pela própria SPTrans.
No caso em questão, o cálculo é para estabelecer qual o montante em dinheiro que a empresa precisa para manter os ônibus operando, considerando trabalhadores atuantes, em férias, em licença ou mesmo doentes. O valor resultante é repassado à empresa, mas não há certeza de que os valores sejam integralmente aplicados para o que foram destinados, já que são baseados em estimativas.
O representante dos cooperados demonstrou que esse cálculo é diferente entre empresas e cooperativas. As empresas recebem, mensalmente, o valor correspondente a 2,57 motoristas por veículos. Ou seja, se o salário de um condutor fosse de R$ 1 mil, a empresa receberia R$ 2.570.
Os permissionários recebem somente o valor correspondente a 2 trabalhadores, acrescido de 65% do valor do salário para encargos trabalhistas. Já os cooperados recebem somente 36%. Utilizando o mesmo exemplo, as empresas receberiam mais R$ 650, e as cooperativas, R$ 360. Pelo exemplo, somente para manter o ônibus com motorista, as empresas receberiam R$ 3.220, e, as permissionárias, R$ 2.360 por mês. Isso se os salários fossem iguais.
Os parâmetro utilizados pela SPTrans são diferentes entre um condutor de ônibus e um de lotação. O primeiro tem R$ 1.614 como pixo salarial e, o segundo, R$ 1.397, uma diferença de 17%.
Segundo Araújo, as empresas recebem cerca de R$ 6 mil a mais por mês em relação às cooperativas. “Cada empresa recebe em média R$ 12 mil, por veículo, para custeio de mão de obra, por mês. Considerando motoristas, cobradores e fiscais. E as cooperativas recebem cerca de R$ 6 mil no mesmo item”, explicou.
O que afeta diretamente a situação financeira das empresas. E mais ainda com o cumprimento do Termo de Ajustamento de Conduta. “Quando se registrar o operador não serão só encargos sociais. Terá de se conceder também os direitos de acordos coletivos, como vale-refeição. Estimamos que o custo dessa regularização será de R$ 6 mil por carro, por mês, ou algo em torno de R$ 400 milhões por ano”, completa Araújo.
Questionado pelo vereador Eduardo Tuma (PSDB) sobre como as cooperativas sobrevivem, Araújo afirmou que é feito um tipo de rateio. “O repasse vem para a cooperativa. Então vemos quais são as linhas que têm problemas, quais são as mais rentáveis e propomos uma divisão que garanta um mínimo de ganho aos trabalhadores”, afirmou.
Os demais vereadores se demonstraram bastante sensíveis à situação dos cooperados, que lotaram o plenário da Câmara com cerca de 300 pessoas.
“Essa diferença de tratamento será questionada em nosso relatório e essa situação terá de ser mudada”, afirmou a relatora da comissão, vereadora Edir Sales (PSD).
“Esta comissão não pode ignorar a situação aqui apresentada. Trata-se da sobrevivência do sistema de transporte da capital, que, além de melhorado, precisa ser equilibrado”, disse o presidente da comissão, vereador Paulo Fiorilo (PT)
Um ponto retomado de outras reuniões da comissão, foi o fato de que as cooperativas “dão lucro ao sistema”, como reafirmou o vereador Milton Leite (DEM). Elas arrecadam, em média, R$ 162 milhões mensais e recebem R$ 156 milhões de repasse. Isso causa uma sobra de R$ 6 milhões entre arrecadação e repasse, que é apropriada pela SPTrans. E, provavelmente, repassada às empresas na forma de subsídios. Como arrecadam mais do que recebem, as cooperativas não recebem subsídio.
Estas empresas ganham R$ 313 milhões mensais, ou 76,87% do montante. Mas arrecadam R$ 209 milhões por mês, o que causa um déficit de aproximadamente R$ 105 milhões, que é coberto pelo repasse de subsídios.
Ao se comparar o total transportado e o valor recebido, as empresas transportam 133 milhões de pessoas por mês (56%) e recebem 67% da remuneração. Já as cooperativas transportam 105 milhões de passageiros/mês (44%) dos passageiros e recebem 33% da remuneração.
Outra reclamação dos permissionários é quanto à taxa de retorno sobre investimento. Segundo Araújo, as cooperativas recebem somente 1% de lucro sobre o valor investido. Entre as empresas concessionárias este índice chega a 6%. “Nós gastamos mais diesel, mais lona de freio, mais suspensão. E recebemos menos. É só observar as vias onde as cooperativas circulam nas periferias e ver o que sofrem os veículos. É preciso reconsiderar os dados de remuneração ou logo teremos problemas”, afirmou Araújo.