Distribuidora que atende 20 milhões de pessoas na região metropolitana lucrou mais de R$ 6 bilhões nos últimos dez anos
Desde o último sábado (4), a tarifa de energia elétrica das 6,8 milhões de unidades consumidoras da Eletropaulo está 15,23% mais cara. Autorizado pela Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), o aumento chegará aos bolsos da população a partir da próxima conta de luz, com vencimento em agosto.
Este é o terceiro reajuste deste ano e afetará mais de 20 milhões de pessoas espalhadas em 24 municípios da região metropolitana do estado de São Paulo, incluindo a capital.
Uma delas é Ondina Maria da Costa, de 53 anos, que trabalha como coletora de dados para pesquisas. Moradora do bairro de Sapopemba, localizado na Zona Leste de São Paulo, Ondina relata que os aumentos já impactaram seu orçamento desde o início do ano.
“Daqui a pouco vou trabalhar só para pagar a conta de luz. Tive que diminuir produtos do supermercado como iogurte e carne. Isso é um absurdo, porque a gente não vive apenas de arroz e feijão”, afirma.
De janeiro para junho deste ano, a conta de Ondina, que vive com mais quatro pessoas, passou de R$ 156,51 para R$ 223,28. Mesmo mantendo o mesmo consumo de energia (355 kWh e 354 kWh, respectivamente), houve um aumento de 42% em apenas seis meses.
A elevação do preço é explicada por dois reajustes. O primeiro deles – que passou a vigorar em janeiro – elevou mensalmente as tarifas de acordo com o nível dos reservatórios das hidrelétricas, que está operando desde janeiro no “vermelho”.
Posteriormente, em março, a revisão extraordinária provocou um novo aumento de 31,9% na tarifa. De acordo com o governo, a medida foi aplicada para cobrir o valor que foi gasto a mais com as termoelétricas, acionadas pela falta de chuva.
Energia privatizada
Para o integrante da coordenação da Plataforma Operária e Camponesa da Energia, Luiz Dalla Costa, as causas dos aumentos exorbitantes não correspondem à falta de chuva ou aos elevados custos das termoelétricas.
“Deveríamos ter a conta de luz mais barata do mundo, mas ocorre exatamente o contrário. Como explicar os altos preços nas contas de luz, enquanto o custo de produção no país é extremamente baixo, baseado nas hidrelétricas? Isso só se explica pelas privatizações ocorridas no setor nos anos 90, que passou a priorizar os lucros”, avalia.
Em abril de 1998, durante a gestão de Mário Covas, a antiga estatal Eletropaulo foi leiloada ao grupo empresarial estadunidense AES, que atua na área de energia em diversos países.
Conforme os relatórios analisados pelo Brasil de Fato SP, a AES Eletropaulo lucrou R$ 6,6 bilhões nos últimos dez anos. Apenas neste primeiro trimestre, a empresa já divulgou um lucro líquido de R$ 46,8 milhões.
Outro elemento destacado por Dalla Costa são os contratos bilaterais realizados entre a AES Eletropaulo e AES Tietê, empresa que detém nove hidrelétricas e três pequenas centrais hidrelétricas na bacia do rio Tietê, ambas controladas pelo mesmo grupo estadunidense.
A nota técnica nº 113, emitida pela ANEEL no dia 29 de abril deste ano, demonstra que existe uma diferença de remuneração paga pela AES Eletropaulo aos seus fornecedores. Enquanto a energia proveniente das hidrelétricas controladas pelo governo federal recebem R$ 33,34/MWh, o preço pago às hidrelétricas da AES Tietê salta para R$ 214,75/MWh, valor 664% mais elevado.
“A AES Tietê vende energia por um preço exorbitante para outra empresa do mesmo grupo empresarial, a AES Eletropaulo. Existe um monopólio evidente do setor elétrico em São Paulo e quem paga a conta é o povo paulista”, afirma.
Golpe nas contas de luz
Para Dalla Costa, outro fator que decifra os últimos aumentos é a especulação que ocorreu no mercado da energia após a Medida Provisória 579, lançada pela presidenta Dilma Rousseff no final de 2012.
A medida propunha a renovação das concessões das hidrelétricas públicas com contratos vencendo até 2015. Como são contratos antigos e já tiveram seu valor de investimento recuperado, a medida estabelecia a diminuição do preço da energia destas geradoras.
Apesar de a medida representar uma redução de 16% das contas de luz dos brasileiros na época, as usinas controladas por empresas estaduais (Copel, Cesp e Cemig), controladas pelo PSDB, não aceitaram a renovação e passaram a vender energia no Mercado de Curto Prazo.
Com isso, hidrelétricas controladas pelo governo federal, como Furnas, passaram a vender, desde o início do ano passado, energia por R$ 33 por kWh, enquanto as gestadas pelos governos tucanos por R$ 822 por kWh – preço 25 vezes mais elevado.
“O que aconteceu foi um verdadeiro golpe do setor elétrico. As empresas apenas se preocuparam com o lucro de seus acionistas e repassaram tudo para o bolso da população”, avalia Dalla Costa.
Por Guilherme Weimann – Brasil de Fato