Márcio Amêndola
Prezado Leitor desta coluna, decidi apresentar aqui uma série de idéias e sugestões na área de Cultura, Memória e História de Embu, através de 18 propostas, algumas pontuais e outras de caráter mais amplo, sentindo a necessidade, neste momento, de contribuir solidariamente com a cidade na qual completarei 30 anos de permanência neste mês de dezembro.
Embu é minha terra de adoção. Sou sim, um filho ‘bastardo’, mas por vezes, o adotivo é menos ingrato que o natural, que se descuida da mãe, faz pouco dela e, por vezes, chega a reclamar não ter pedido para nascer de seu ventre. Quando vejo o tanto que sonhei para esta cidade e o quanto ela ainda está aquém de meus sonhos, dou-me conta que ela, sem que seus filhos se manifestem, nada pode fazer. O ser-cidade só deixa de ser inanimado, quando seus filhos se levantam pelas boas e nobres causas.
Bons amigos já me aconselharam: “guarde seus projetos, não os lance nas praças, vão surrupiá-lo e tomar-lhe a glória”. Como jamais guardei segredos por muito tempo, nem tenho ambições a esta altura, decidi jorrar tudo o que penso para esta cidade, minha mãe, aliás, em homenagem à outra, terrena, que faria 80 anos em 15 de novembro, e que veio a Embu antes de mim, e me seduziu para que também adotasse esta cidade como minha. Hoje posso dizer que construí minha vida e de minha família aqui, com minha companheira de todas as horas e meus dois filhos embuenses, já adultos a esta altura.
Mas, deixando questões pessoais à parte, seguem minhas humildes sugestões para que esta cidade volte a fazer sentido para mim, ao menos nos campos que defendo e amo: a História e a Cultura. Às propostas:
1.Criação da Casa da Palavra de Embu e do Museu da Imagem e do Som.
Proponho a criação de espaço Público e Permanente, onde haja: Guarda de Acervo de Livros, Áudio, Vídeo, Cinema, Fotografias sobre Embu ou com seus personagens, Oficinas de Criação Literária, interação Escola-Escritores, Saraus, Revistas Literárias, etc….. Haverá campanhas de arrecadação de fotos antigas, documentos sobre os bairros, feira de artes, catálogos de Salões de Artes (já tenho vários, de 1964 aos anos 1980), cartazes, etc. Todo o material deve ser digitalizado e colocado à disposição na Internet para pesquisa e perpetuação da memória coletiva da cidade. Outra proposta é seguir os passos do ‘Museu da Pessoa’ de São Paulo, fazendo nosso próprio espaço, junto ao Museu da Imagem e do Som. O Museu da Pessoa funciona assim: Nossa equipe entrevista personagens da cidade: de ex-prefeitos, a simples moradores da periferia. O critério é a pessoa ter uma história para contar e autorizar o arquivo público de sua imagem. Queremos perpetuar os personagens da cidade através de suas histórias de vida. Representantes religiosos, comunitários, músicos, poetas, artistas plásticos, pedreiros, carpinteiros, estudantes, aposentados, pioneiros dos bairros, até crianças, poderiam falar sobre sua vida na cidade de Embu, e o que ela representa nas suas vidas. É barato (basta filmar a pessoa e colocar o vídeo em um arquivo) e tem grande significado simbólico e cultural para a vida de nossa cidade.
2.Núcleo de Produção de Vídeo (TV e Documentários). De caráter público, com oficinas de capacitação de jovens e adultos até a 3ª Idade.
A ideia é que deste núcleo surja a TV Pública de Embu, com produção local de Cultura, Documentários, etc. Caso não possamos viabilizar uma TV Educativa aberta, a alternativa seria criar um Canal Online (pela Internet), e também disponibilizar nossa produção fílmica nas Video-Locadoras da cidade (com empréstimo gratuito, junto com as fitas alugadas). Os filmes também seriam veiculados nas Escolas Públicas Municipais, salas de espera de Hospitais, Pronto-Socorros, Unidades Básicas de Saúde e Praças de Atendimento da Prefeitura.
3.Projeto História e Memória de Embu, em 4 volumes.
O Livro sobre a Imigração Japonesa, de Márcio Amêndola de Oliveira, com apoio de Sadao Nagata, está mais adiantado. A saga dos Imigrantes Japoneses de Embu no século XX até os dias atuais. (O projeto está em desenvolvimento de forma mais abrangente, envolvendo Embu desde a fundação provável, em 1554, até a ascensão dos movimentos sociais (Panela Vazia, Contra a Carestia, Movimento dos Desempregados – 1984, no Jd. Sta. Emília, Acampamento do Ibirapuera de 1983, com decisiva participação de Embuenses, Ocupação do SINE – Serviço nacional de Emprego, em 1984, também com pessoal de Embu) nos anos 70 a 80, loteamentos clandestinos, Movimento de Moradia, Movimento Ambiental, História da Luta pela Saúde, particularmente dos Hospitais Regionais e da Maternidade de Embu (já tenho extenso material sobre o tema) explosão populacional, etc. O livro dos japoneses seria a terceira parte do projeto, mas antecipada devido ao Centenário da Imigração no Brasil, ocorrido em 2008. Já realizamos três grandes exposições de fotos (2008/2009/2010) e temos farto material sobre o tema, apesar de ainda insuficiente para o livro, que deve ficar pronto em breve, mesmo sem qualquer incentivo ou patrocínio. As etapas do projeto são: Volume I: Embu das Artes: dos índios aos Jesuítas (Séculos XVI a XVIII; Volume II: Embu das Artes: A Aldeia se transforma e se Emancipa; Volume III: Embu das Artes: A saga dos Japoneses; Volume IV: Embu das Artes: História Política e Cultural, da Arte ao Caos, do Caos à nova Cidade.
4.‘Cadernos de História de Embu’.
Estão em fase de pesquisa e elaboração por mim e meus filhos (ilustrações) uma série de brochuras (devem ter no máximo 40 páginas cada) sobre a História de Embu, em linguagem infanto-juvenil, para crianças de 7 a 12 anos. A ideia é realizar a obra por questões temáticas, tipo: ‘Lendas de Embu’; ‘Surgimento da Aldeia de M’Boy’; ‘As lutas Populares do Povo de Embu’; ‘Nossa História Política’, etc. O material poderia ser usado como para-didático em escolas públicas e privadas, e colocadas em bancas de jornal (não há livrarias na cidade, infelizmente).
5.Reedição de ‘Memórias de M’ Boy, os Costumes da Roça’, de Joaquim Gil Pinheiro, obra de 1910 – temos uma 2ª edição original de 1912 – em seu CENTENÁRIO, a ocorrer em 2010. (O livro conta os costumes do povo simples das roças de Embu, além de ser o PRIMEIRO a registrar nossas LENDAS e os primórdios da ADORAÇÃO À SANTA CRUZ, costume local). Já foi digitalizado parte do livro. Trabalho em andamento e à procura de patrocinadores.
6.Reedição de “Vida do Venerável Padre Belchior de Pontes”, do Padre Manoel da Fonseca, produzida em 1752 (fala da Aldeia de M’Boy no século XVII e da biografia do Padre Belchior, construtor do Convento do Jesuítas de Embu, há mais de 300 anos).
7.Reedição do Romance intitulado “Padre Belchior de Pontes”, de Júlio Ribeiro, de 1876 (Júlio Ribeiro é o mesmo autor do romance ‘A carne’, que escandalizou o País no século XIX, por ter temática erótica, quase pornográfica. O livro ‘Padre Belchior de Pontes’ fala justamente do dilema do Padre diante do celibato).
8. Reedição do Projeto intitulado “Estrada de Ferro de M’Boy a Santo Antonio do Juquiá”, de Henrique Boccolini, de 1906. (Boccolini restaurou a Igreja dos Jesuítas no início do século XX, quando estava em ruínas. Neste projeto repleto de fotos da época, o engenheiro tentava construir uma ferrovia partindo de Embu até o Vale do Ribeira. Ele também sonhava construir uma Vila chamada ‘Hygéia’ – Deusa da Saúde na mitologia grega – ao longo desta ferrovia, no Embu, com casas cheias de jardins, onde haveria muita qualidade de vida). A trilha aberta por Boccolini acabou servindo de base para o traçado da atual BR-116.
9.Reedição da obra de Moacyr de Faria Jordão sobre a História de Embu.
Seus livros foram editados entre 1960 e 1972, a cada quatro anos. Em 1976 a edição ficou no prelo, devido à sua morte, sendo editada em 2004, por mim, como organizador da obra. Pretendo agora realizar uma compilação de seus cinco livros, numa única obra definitiva.
10.Antologia Poética de Embu das Artes (não é para novos autores, mas com poesias de autores que já registraram seus trabalhos em livro ou na vida cultural de Embu das Artes: Solano Trindade, Assis do Embu, Bellonzi, Ana Moysés, Pracílio, Paulo Som, Maria Isabel Hodinik, etc. (obra coletiva). Tenho poemas inéditos de alguns destes artistas em meu arquivo pessoal.
11.Livro sobre a História de Embu, de autoria de Pedro Saturnino (está pronto, faltando detalhes de revisão e edição final).
12.Guerra Santa do Sertão (ou outro título do autor), de Joel Câmara.
Editei três livros de Joel Câmara, de forma artesanal. O ‘Guerra Santa’ foi editado pelo Chico Cordão do Sesc, sendo a obra mais fantástica de Joel, contando a saga de Antonio Conselheiro. Eu diria que a obra é comparável à de Euclides da Cunha, ‘Os Sertões’, porém o trabalho de Joel Câmara é mais artístico e literário, obviamente.
13.Livro ‘Solano Trindade, o Guerreiro das Artes’, de Josias Patriolino (obra em versos alexandrinos – 12 sílabas poéticas, em homenagem a Solano Trindade e à Terra das Artes e seus personagens). Perdi contato com o Sr. Josias, mas seu trabalho é digno de publicação.
14.Livro ‘Terra Bruta, Pedra Bonita’, de Nello Oliveira (romance caipira inédito, já pronto para publicação). Revisei esta obra há anos, e o Nello jamais conseguiu publicá-lo. Apesar da simplicidade do texto, é um autor de Embu.
15.Memória do Poder Legislativo, de Márcio Amêndola de Oliveira.
História da Câmara de Embu desde a eleição dos primeiros vereadores, nos anos 1940, ainda por Itapecerica da Serra. (Falaremos sobre as crises institucionais, com recortes na Ditadura Militar, prefeitos e vereadores cassados ou afastados ao longo de toda a história, e alguns casos de luta e resistência do Poder Legislativo, além de casos pitorescos, como as leis interessantes. Havia uma delas, autorizando a prefeitura a trocar os reios e cela da carroça do burro que recolhia o lixo da cidade).
16.Produção Literária de Embu e/ou de Embuenses ao longo da História, por Márcio Amêndola de Oliveira.
(Projeto em andamento, não se tratando necessariamente de um livro, mas de material a ser disponibilizado até pela Internet. Pretende registrar e guardar todo o acervo literário e de produção intelectual de Embu e dos embuenses. Já existe grande base para o projeto proposto, com acervo e um arquivo de Powerpoint preparado). Mais de 50 livros já foram escritos sobre o Embu ou por embuenses, entre obras de ficção e documentais. Tenho exemplares da maioria destes livros, quase todos originais. O mais antigo original é um de Joaquim Gil Pinheiro (1912) e o mais antigo em edição facsimilar (de 1932) é sobre o Padre Belchior de Pontes, escrito originalmente em 1752 (ver abaixo).
17.Dicionário de Embu das Artes, de ‘A’ a ‘Z’.
Disponibilizar na Internet informações básicas sobre tudo o que envolve Embu, por meio de verbetes, desde os nomes de seus personagens históricos, até fatos mais marcantes. O objetivo é servir como ferramenta para professores, estudantes e moradores da cidade, sobre sua vida e seus personagens. Para se dar um nome a uma rua, por exemplo, este ‘Dicionário’ poderia ser a primeira base de consulta. Dali poderíamos sugerir links com mais detalhes sobre o assunto ou personagem abordado. Seria como uma ‘Wikipédia’ de Embu, na qual poderiam todos os embuenses ser seus colaboradores, mas é claro, com o crivo de um Conselho Editorial encarregado de verificar a veracidade e exatidão de cada verbete.
18.Festival de Inverno de Embu das Artes.
Um festival concorrente ao de Campos do Jordão foi idealizado pelo ex-prefeito Nivaldo Orlandi em 1983. Participei da equipe que elaborou a proposta, juntamente com o professor Cagnin, sua esposa (eram da Secretaria de Educação Municipal à época), o filósofo e escritor Paulo de Tarso Cabral Medeiros, a psicóloga Zina Hermínia Médici Lúcio e Iracema (Sinhô). Fomos a Campos do Jordão e uma das organizadoras do Festival à época, Ana Mae Barbosa ex-professora da USP e importante arte-educadora no País, nos recebeu por uma semana. Anotamos tudo, fizemos um projeto alternativo a Campos do Jordão, contemplando: Música Sacra / Música Popular e Folclórica / Oficinas de Arte em todas as modalidades / Teatro de Rua / Oficinas para Arte-Educadores e Professores das Redes Municipal e Estadual / Shows com artistas populares consagrados (Alceu Valença / Rolando Boldrin / Milton Nascimento, etc). A programação ocorreria durante parte do mês de julho, anualmente, durante 15 ou 20 dias. Buscaríamos apoio institucional de empresas privadas e de economia mista (Estatais). Infelizmente, por divergências políticas posteriores entre o prefeito e o secretário de Educação, o projeto não foi adiante. Mas hoje, criar um grande evento que envolva cultura, educação e entretenimento ainda é possível, principalmente pelo fato de que Embu está às portas da cidade de São Paulo, seu centro tem ‘carisma’ turístico conferido por nossa Feira de Artes, nossa Hotelaria melhorou nos últimos 30 anos, e temos ainda o Rodoanel e a BR-116. Somos a ‘esquina do Mercosul’, não apenas para novas Indústrias e depósitos de mercadorias (logística), podemos ser também a ‘Esquina do Mercosul’ das artes, da música, do folclore. Poderíamos chamar a atenção da grande mídia, do grande público e grandes patrocinadores realizando um evento de envergadura e mais ambicioso que os atuais eventos anuais que já realizamos. Impossível? Se não dermos o primeiro passo, jamais saberemos.
Algumas destas propostas foram colocadas à disposição da Secretaria Municipal de Cultura (agora ampliadas e corrigidas), mas ainda aguardo resposta, desde 07 de Julho de 2009. O governo do Partido dos Trabalhadores ainda não resgatou a memória dos próprios trabalhadores, ou mesmo a chamada ‘história tradicional’ de Embu de maneira abrangente e adequada. Ressalvem-se algumas iniciativas particulares apoiadas pelo governo do Prefeito Geraldo Cruz, que conseguiu recursos para imprimir os Livros de M.F. Jordão, editado por mim em 2004, e de Raquel Trindade, em 2005, agora em segunda edição, a ser lançada no governo do Prefeito Chico Brito, que também ajudei a corrigir, junto à Editora, de forma voluntária.
Ouso afirmar que o governo popular de Embu ainda está a dever a organização de um espaço de memória e história abrangente, já que espaços como o Centro Cultural Mestre Assis, o Teatro Popular Solano Trindade, e o Memorial Sakai em que pese serem excelentes espaços de produção cultural, tem suas especificidades e não contemplam a abrangência necessária a uma cidade com mais de quatro séculos de História.
Nestes 456 (!) anos de vida de nossa cidade, Embu ainda NÃO TEM um Departamento de Patrimônio Histórico e Cultural, que poderia abrigar todos estes e outros projetos de grande interesse público. Os custos para a maioria destas iniciativas seriam baixíssimos, se comparados aos benefícios que trariam para a imagem do governo e para a própria cidade e seus moradores.
Márcio Amêndola de Oliveira – Graduando em História USP: http://contextohistorico.blog.terra.com.br – Coordenador de Documentação e Memória do Instituto Zequinha Barreto: www.zequinhabarreto.org.br – Assessor de Comunicação da Câmara de Embu / MTB: 42.753/SP: www.cmembu.sp.gov.br – Diretor do Site www.fatoexpresso.com.br
Contatos E-Mail: cme.marcio@terra.com.br
Marcião, parabéns pela iniciativa e pela reflexão, continue sendo essa referência de historiador, socialista e ser humano que vc é!!
Abração!!
márcio parabens por sua iniciativa!
é fantastica essa atitude de reavivar a historia de um local.acredito que muitos embuenses nao conhecem 10% de suas historias e origens.
sem falar da famosa feira do embu,que é mais do uma simples feira de artesanato,mas sim um monumento vivo.
parabens abraço
Márcio Amêndola, gostei de ter lembrado do meu trabalho. Estou lhe devendo uma visita. Estou trabalhando muito (e muito longe!), mas vamos discutir o livro Solano Trindade, o Guerreiro das Artes. Nosso poeta-mor merece… As propostas que você apresenta são ótimas para o resgate e manutenção de nossa História. Parabéns!