Documentos revelados pelo site Wikileaks mostram que EUA, a partir de representações diplomáticas investiga possíveis ações terroristas no Brasil, bisbilhota nos assuntos internos brasileiros, recruta ‘colaboradores’ entre membros do nosso governo e da comunidade islâmica, entre outras ações. E ainda critica presidente eleita Dilma Rousseff por recusar pressões para mudanças na legislação antiterrorismo.
** Márcio Amêndola de Oliveira
Documentos secretos da embaixada dos EUA sobre possíveis atividades terroristas no Brasil vazados pelo Wikileaks, site dedicado a revelar documentos militares e diplomáticos confidenciais dos EUA e de outros países, dão conta de uma grande tentativa de interferência daquele país nos assuntos internos do Brasil, particularmente no que se refere ao que os Estados Unidos consideram como ‘atividades terroristas’.
Somente em 2010 o WikiLeaks divulgou aproximadamente 400 mil documentos secretos da guerra do Iraque. O site também já divulgou 90 mil relatórios confidenciais sobre os abusos praticados pelos EUA e aliados no Afeganistão. Este lote agora revelado no Brasil refere-se à correspondência da Embaixada dos EUA e mostra um enorme grau de tentativas de interferência em nossa legislação. Os documentos tem particular preocupação com o MST e os Muçulmanos no Brasil, alegando que tais grupos seriam ‘terroristas’, misturando conceitos de ‘antiamericanismo’ com ‘terrorismo’, confusão típica – e proposital – perpetrada a partir da visão de ‘segurança nacional’ imposta pelos dois governos dos Bush, pai e filho, que provocaram as duas guerras do Iraque e a do Afeganistão, com forte caráter racista.
A documentação (ver no anexo abaixo) mostra uma clara tentativa de interferência nos assuntos internos do Brasil por parte dos EUA em relação a uma pretensa legislação sobre terrorismo que mascara o combate e criminalização às ações ‘anti-americanas’ e dos movimentos sociais, como o MST e outros grupos que denunciam as ações das transnacionais dos EUA no Brasil (como as empresas do agronegócio, que roubam princípio ativo de plantas brasileiras, promovem o plantio de transgênicos e uso de agrotóxicos sem controle). Mas, para os EUA, tudo o que ataca os interesses comerciais de suas empresas, também é colocado na tabula rasa do ‘terrorismo’.
Indução de ‘ataques terroristas’ para ‘convencer’ Brasil
Os documentos mostram problemas gravíssimos, como a indução do consulado dos EUA, de que um ‘motivo grave’ poderia reverter o desinteresse anti-terrorista do Brasil, diante de nossa posição mais pacífica em relação a esses atentados. O Cônsul sugeriu (nos textos originais no anexo) como ‘terroristas’, usando palavras do presidente Lula, os atos praticados pelo PCC (Primeiro Comando da Capital), organização criminosa de São Paulo, que promoveu atentados em 2006. Imaginem agora, os ‘dignos’ representantes consulares dos EUA no Brasil devem estar se ‘esbaldando’ com a invasão de favelas do Rio de Janeiro com blindados em nome de atacar o crime organizado.
No limite, os Estados Unidos podem ganhar nova força junto à grande mídia brasileira, no sentido de aprovar uma rígida legislação anti-terror no Brasil com a desculpa de combater o crime organizado, quando, na verdade, os EUA estão pensando em sua própria proteção contra atividades anti-americanas praticadas por países árabes e da América Latina.
Ataque a Dilma Rousseff
Os EUA mostram também a contrariedade com a ex-ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, por ser contrária a uma legislação anti-terror criada dentro do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), claramente ‘inspirada’ por ‘sugestões’ (ingerências) dos EUA. O Brasil REJEITOU esta estranha proposta, desagradando setores da inteligência militar brasileira que não escondem o descontentamento com a forte presença de ‘esquerdistas’ dentro do governo brasileiro e das ações dos movimentos sociais, como o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra). Os documentos estadunidenses chegam a praticamente citar como ‘esquerdistas’ a própria presidente eleita Dilma e o ex-ministro da Justiça, Tarso Genro.
Num dos trechos revelados, os EUA constatam a contrariedade da OAB com a proposta de legislação antiterror: “A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB, a associação de advogados do Brasil) criticou o governo por propor legislação que na verdade seria, de acordo com o presidente da OAB, Cezar Britto, apenas um tênue véu para criminalizar as ações dos movimentos sociais e daqueles que lutam por igualdade. Forçadas à defensiva, várias autoridades de alto escalão do GSI (Gabinete de Segurança Institucional) sugeriram publicamente que qualquer legislação anti-terrorismo seria raramente usada e que os juízes teriam muito cuidado em sua aplicação. Depois, em novembro de 2007, o governo anunciou, sem cerimônia, que não apresentaria o projeto de lei ao Congresso”, enterrando a proposta.
O documentos mostram ainda uma extrema preocupação com os muçulmanos no Brasil, particularmente em São Paulo e na tríplice fronteira (Brasil, Argentina e Paraguai), na região de Foz do Iguaçu. Os EUA realizaram uma política de aliciamento de setores sunitas brasileiros (mais moderados), que deveriam ‘vigiar e observar’ as atividades islâmicas no Brasil, particularmente de Xiitas mais pobres, que tenderiam a ser mais antiamericanos que os demais. Veja na íntegra algumas destas correspondências vazadas pelo Wikileaks, no anexo.