Por Allan Robert P. J.
No correr da minha experiência profissional na área comercial aprendi que preferência é hábito de consumo. As pessoas “preferem” determinada marca de um certo produto que estão habituadas a consumir. Aqui vale uma ressalva: a dona de casa que usa determinada marca de sabão em pó por ser o mais barato, prefere o outro, que lava mais branco mas custa mais caro. Somente por uma questão de economia não o usa. Já um bebedor de cerveja “prefere” a marca a que está habituado a consumir. Neste campo, todas as influências são externas: a opinião de um amigo, a sugestão que a propaganda conseguiu transmitir e a imagem que ela imprimiu no ego do consumidor, a disponibilidade do produto, a chamada venda por impulso nos supermercados, enfim, mil armadilhas do chamado marketing.
Da mesma forma, alguns produtos nascem de uma necessidade até então não estimulada, como os filtros solares, por exemplo. Gênio é quem descobre o óbvio e consegue transformar em produto uma resposta a essa necessidade. Tais descobertas estão muito mais ligadas à cultura local, mas podem ser exportadas, com as devidas ressalvas. Tudo uma questão de mercado. Um amigo nigeriano comentava que as vendas de filtros solares no seu país são um fiasco, pois além do fato de o seu povo encarar o produto como inútil, a importação faz com que o preço seja inadmissível para a maioria da população.
Aqui na Itália o sabão em pó muda conforme a estação: na primavera vende-se muito o tipo de sabão que “deixa as cores mais vivas”; no verão, “o branco total”; outono e inverno são as estações do “deixa as roupas escuras mais escuras”. Pois é! Aqui tem um sabão em pó que deixa as roupas pretas sempre pretas. Produto que alcança um grande sucesso num país onde todos usam preto no inverno. Curiosidade: embalagem de sabão em pó inferior a dois quilos é mais raro que pé de cobra.
Outras curiosidades: propaganda de cerveja, só a partir do início da primavera. Nos bares, a diversidade de chocolates se resume a dois tipos: com ou sem avelãs e a reduzidíssimas quantidades no verão. Marca de macarrão que fizer propaganda mostrando pratos pesados ou gordurosos e, com isso, associar à sua imagem a idéia de que massa engorda, adeus! Todas as propagandas de água mineral mostram pessoas tomando água na garrafa. Estão formando uma geração de mal-educados. Depois, não poderão reclamar.
O telefone celular muda de acordo com a moda. Carro, a cada dois ou três anos. Férias nas Ilhas Maurício, México, Santo Domingo, Cuba, Tailândia ou Jamaica (porque o Brasil não faz a mesma divulgação turística que tantos outros países?).
O consumo de água mineral em garrafa plástica é de impressionar, graças ao elevado teor de calcário na água doce de grande parte da Europa. As propagandas esmeram-se em mostrar montanhas para associar ao produto uma imagem de frescor, transmitindo a informação de que aquela água não atingiu solos profundos nem planícies, onde se encontra o calcário. Pelo mesmo problema, toda dona de casa consome produtos para evitar o acúmulo de calcário nas máquinas de lavar roupas, máquinas de lavar louças e usa água destilada para os ferros de passar a vapor.
Frutas e verduras são compradas em quantidades suficientes para dois, três dias no máximo. Devem ser frescos. Abarrotar o carro no supermercado, somente se for dia de festa. Ou estrangeiro. Mas ao menor sinal de crise (qualquer que seja) os consumidores de mais idade aumentam o estoque de farinha e sal. Serve para o pão, que sustentou muitos em tempo de guerra.
Sorvete vende o ano inteiro, inclusive quando neva. O primeiro sonho de consumo é uma Bianchi, uma marca chique de bicicleta. Usam a camisa do time do coração, mas a da Seleção Italiana, não. É mais fácil encontrar alguém com a camisa da Seleção Brasileira. Apesar de não existir propaganda de cigarro, todo mundo fuma. Encontrar charutos aqui é mais fácil que no Brasil, produtor de bons charutos. E, com um câmbio favorável e uma política equivocada do mercado brasileiro, um charuto cubano custa o mesmo que um made in brazil. Vinho. Muito vinho. Uma garrafa de cachaça brasileira custa mais que uma garrafa de um razoável scoth escocês, mas custa menos que uma boa grappa.
Festa sem música brasileira (velhas músicas de Carnaval) não é festa. Quando querem exprimir alegria verdadeira e contagiante, costumam referir-se à torcida brasileira, que consideram patrimônio mundial. E nós nem aproveitamos para exportar.
Tudo uma questão de mercado. Os hábitos diversos são o que caracterizam as diversas culturas. Mas é o tal marketing que decidirá se a nova geração usará copo ou irá beber água na garrafa. Se vale a pena ou não, montar uma fábrica de filtro solar na Nigéria. E até o período em que chocolate e cerveja serão consumidos. A única certeza que nos cabe é que seremos cada vez mais consumidores. Mesmo dos produtos que inicialmente rejeitamos. Ou o leitor vai me convencer de que o primeiro gole de cerveja foi uma experiência positivamente inesquecível?
**Allan Robert P. J., carioca de nascimento, tem 51 anos, viveu em Embu (SP) por quase duas décadas e lá se casou com Eloá, em 1987. Mudou para Salvador (BA) onde estudou Economia e o casal teve duas filhas. De lá, foram para a Itália, onde vivem atualmente. Allan é micro empresário do ramo automotivo, e Eloá trabalha no ramo de alimentação. Ambos têm raízes (amigos e parentes) na ‘ponte’ Embu-Assis-SP. Allan é irmão dos advogados Bruce P. J. e Dawidson P. J., radicados em Embu. Dawidson já foi do primeiro escalão da Assessoria Jurídica da Prefeitura de Embu no governo Geraldo Puccini Junior (1993-96), e ambos já participaram da diretoria da subsecção da OAB de Embu”.