São Paulo – A política urbana adotada pela Prefeitura da capital paulista “favorece negócios imobiliários” e expulsa moradores para a periferia de outras cidades, analisa o arquiteto e urbanista Kazuo Nakano, do Instituto Pólis. Ações como a terceirização do bairro da Santa Ifigênia para a iniciativa privada, por meio de concessão urbanística, e operações urbanas – baseadas em venda de potencial construtivo – em várias regiões, vão além da privatização do poder público e resultam no “retrocesso” em políticas públicas do município.
Com forte articulação entre mercado imobiliário e financeiro e a presença de grupos transnacionais, a política urbana também estaria aprofundando a desigualdade no município. “Esse modelo abre a possibilidade muito concreta de aprofundamento da desigualdade e de processo de expulsão, porque quem não pode pagar por esses espaços renovados, que recebe investimentos públicos e privados vão ter de procurar outro lugar na cidade, porque não vão desaparecer”, diz Nakano.
A falta de políticas públicas urbanas, de assistência social e habitacionais atingiu um patamar tão grave, explica o urbanista, que o processo de expulsão em andamento não é mais dos pobres para a periferia. “Quem não pode acessar imóveis de alto valor, tem de morar em loteamento clandestino, favela… Só que não é mais em São Paulo, é em Itaquaquecetuba, Francisco Morato, Itapevi”, exemplifica.
Nakano se diz “muito crítico” ao modelo de urbanismo adotado pela Prefeitura de privatizar os bairros, por meio de concessão urbanística. Essa ferramenta permite ao prefeito Gilberto Kassab (ex-DEM, em direção ao PSD) transferir o direito de desapropriar imóveis comerciais e moradias em uso, que é exclusivo do município, a empresas privadas. A empresa responsável passa a ter o poder de exploração comercial dos imóveis desapropriados. “Está muito claro que esse processo de aplicação está voltado para criar oportunidades de regressos imobiliários, em detrimento a uma série de interesses legítimos de outros grupos sociais”, aponta.
Retrocesso
Outra crítica de Nakano diz respeito à venda de potencial construtivo (Certificados de Potencial Adicional de Construção – Cepacs) nas operações urbanas. “O sentido das operações urbanas em São Paulo é leiloar Cepacs para comercializar estoque de potencial construtivo, favorecer os investimentos dos empreendedores imobiliários e só. Sem isso estar a serviço de um projeto democrático de cidade, baseado na efetivação de direitos sociais, no atendimento das demandas da população mais pobre.”
“Hoje no quadro de escassez de terra urbana desocupada, potencial construtivo virou objeto de disputa e de desejo dos investidores privados. Cepac serve a isso”, esclarece. Quatro operações urbanas estão em andamento na capital e outras três estão em processo de consulta para contratação de projeto.
As ações no campo urbanístico e social da Prefeitura de São Paulo não significam privatização do poder público, analisa Nakano. O quadro é de “omissão e redução” dos alcances das ações públicas da Prefeitura para atender demandas sociais. “O que há é um retrocesso na política habitacional, na política de assistência social, na política urbana.”
O urbanista interpreta que as ações do governo municipal trabalham para favorecer o mercado. “A grande consequência é justamente favorecer a lógica do mercado, da mercantilização do espaço urbano, porque o negócio se viabiliza quando você tira da frente o que está atrapalhando. Geralmente, no espaço urbano, o que atrapalha o negócio são justamente as populações pobres, as populações mais vulneráveis, as populações que não podem acessar o mercado e o poder econômico. Esse retrocesso não é neutro”, alerta.
Forma sustentável
A eleição de prioridades por meio de um processo participativo permanente é a alternativa ao que ocorre na cidade, acredita Nakano. “A partir dessas prioridades, decisões são tomadas, ações são feitas, obras são executadas e investimentos são realizados. Essa falta de uma visão clara das prioridades é decorrente da ausência de um processo participativo”, dispara.
O processo de planejamento participativo na definição de prioridades seria o primeiro passo para ações sintonizadas com a realidade dos munícipes. “Isso faria com que a gente começasse a ver com clareza o que é que a cidade de São Paulo realmente precisa. Ela precisa de concessão urbanística na Nova Luz? Ela precisa de um teatro de dança de R$ 600 milhões no Anhangabaú? Ela precisa de concessão urbanística na Água Branca? Ninguém está tendo a oportunidade de fazer essa discussão com profundidade porque ela está sendo empurrado goela abaixo pela Prefeitura.”
(Por: Suzana Vier, Rede Brasil Atual)