São Paulo – A partir desta semana, a administração pública brasileira, em todos os níveis, ficará mais transparente e suscetível ao controle da sociedade. Pelo menos no papel. Na quarta-feira (16), passa a vigorar no país a Lei 12.527, conhecida como Lei de Acesso à Informação (LAI). O texto vem regulamentar alguns princípios constitucionais que, desde 1988, asseguram a todos os cidadãos o direito de receber informações públicas de interesse particular ou coletivo – e define a obrigação do Estado em fornecê-las.
“O cidadão paga as contas do Estado. Portanto, tem o direito de entender o que está acontecendo com seu dinheiro, não apenas do ponto de vista financeiro, mas também no que se refere às decisões que o Estado toma em seu nome”, defende Guilherme Canela, assessor regional da Unesco para o Cone Sul. “O acesso à informação geralmente leva à melhora das políticas públicas. A tendência é que, quanto mais transparente, menos corrupto será o Estado.”
Sigilo
Alguns documentos poderão permanecer longe dos olhos do povo. De acordo com a LAI, sigilosa é a informação que, uma vez divulgada, pode colocar em risco a segurança da sociedade e do Estado. Isso significa trazer perigo à integridade do território nacional, à defesa e à soberania do país; à condução das relações internacionais; à vida, à segurança e à saúde da população; à estabilidade financeira, econômica ou monetária; às estratégias das Forças Armadas; ao desenvolvimento científico e tecnológico; à segurança das instituições e autoridades nacionais; e às atividades de inteligência do país.
Mas as informações que se enquadrarem nos quesitos acima não ficarão eternamente sob sigilo, como ocorria até então. O secretismo agora tem limites legais: 25 anos para informações ultrassecretas; 15, para as secretas; e 5, para as reservadas. O tempo é contado a partir da data de produção dos documentos. Informações pessoais – relativas à vida privada, intimidade e honra – também ficam protegidas. Neste caso, o prazo é de cem anos.
Há dados, porém, que escapam a qualquer sigilo. “Não poderá ser negado acesso à informação necessária à tutela judicial ou administrativa de direitos fundamentais”, define a LAI, incluindo nesse grupo as violações dos direitos humanos por agentes públicos. Daí que a nova legislação crie expectativa positiva nas organizações civis que lutam pela abertura dos chamados “arquivos da ditadura”. Por outro lado, o texto não interfere no funcionamento das leis que asseguram os sigilos bancários, telefônicos, postais, industriais ou econômicos – ainda que se tratem de empresas, entidades ou personalidades públicas.
“Até agora, tínhamos regras sobre o sigilo das informações, mas não sobre o acesso”, lembra Izabela Correia, coordenadora de Promoção da Ética, Transparência e Integridade da Controladoria-Geral da União (CGU), órgão que está encarregado de conduzir o processo de adequação à LAI no âmbito da administração federal. “O Brasil já era considerado um país aberto, sobretudo depois da aprovação da Lei de Responsabilidade Fiscal, em 2000. Mas tínhamos essa dívida com a sociedade.”
Punições
A LAI determina que a divulgação das informações deve ser a regra geral para todo o setor público brasileiro. O sigilo passa a ser exceção. Aliás, o ideal é que a transparência seja um valor ativo do Estado: espera-se que as informações sejam disponibilizadas independentemente de solicitação. Caso a requisição seja necessária, a lei pede que os órgãos da administração federal criem Serviços de Informação ao Cidadão (SIC) para centralizar e atender os pedidos – é a chamada transparência passiva.
Para reduzir o poder do funcionário público sobre os dados estatais, estão previstas punições administrativas para aqueles que se negarem a fornecer os dados requisitados pela população. Vão de simples multas até a demissão, passando por processos judiciais. Quem destruir, alterar ou extraviar documentos também estará enrascado. Da mesma maneira, a lei define sanções àqueles que divulgarem dados ultrassecretos, secretos ou reservados. “O acesso à informação classificada como sigilosa cria a obrigação para aquele que a obteve de resguardar o sigilo”, diz o texto.
Para fazer-se cumprir, a LAI prevê ainda a instituição de uma Comissão Mista de Reavaliação de Informações, que terá a palavra final sobre a sigilosidade – ou não – das informações. No entanto, esse órgão terá efetividade apenas no âmbito federal. As esferas estaduais e municipais deverão estabelecer seus próprios mecanismos legais para garantir o conteúdo da lei.
“Ainda não há definição oficial sobre o formato da Comissão Mista”, esclarece Izabela Correia. A coordenadora da CGU explica que estas e outras lacunas eventualmente deixadas pelo texto da LAI serão preenchidas por um decreto presidencial a ser publicado até quarta-feira, dia em que a lei passa a vigorar.
(Por: Tadeu Breda, Rede Brasil Atual)