Um dos principais mecanismos de proteção de florestas e da biodiversidade é a criação de áreas protegidas, como Unidades de conservação (UC) e Terras Indígenas (TI). Entretanto, alimentado por decisões políticas do Brasil, que paralisou novas demarcações e desmonta sistematicamente seus sistemas de proteção, o desmatamento voltou a crescer, em uma corrida alucinada pela ocupação ilegal do território.
Em 2019, o desmatamento da Amazônia aumentou 30%, segundo dados do Prodes, com crescimento expressivo em UCs (55%) e TIs (62%). E a tendência é que 2020 siga o mesmo caminho. De janeiro a abril, os alertas de desmatamento na Amazônia acumulam alta de 62%, de acordo com o Deter, e dentro de UCs este aumento já chega a 167%, na comparação com o mesmo período do ano passado.
Em uma série de denúncias, o Greenpeace Brasil vai mostrar como grileiros, madeireiros e pecuaristas vêm aproveitando o clima político favorável ao crime, para avançar sobre imensas áreas de floresta, colocando em risco espécies únicas da biodiversidade brasileira.
Quem derruba a floresta? Que espécies estão em risco? Como o fruto do crime chega a mercados nacionais e internacionais? É isso que vamos revelar nesta investigação sobre o Parque Estadual da Serra Ricardo Franco, no Mato Grosso, onde uma floresta que deveria estar protegida vem sendo trocada por pasto e a fauna substituída por bois.
O Parque Estadual Serra Ricardo Franco foi criado para preservar a biodiversidade da região. Mas desde sua criação sofre com o desmatamento e avanço da pecuária
O Parque Estadual da Serra Ricardo Franco foi criado em 1997, abrangendo 158 mil hectares, na fronteira do Brasil mato-grossense com a Bolívia, com o objetivo de “proteger os recursos hídricos e a viabilidade de movimentação das espécies da fauna nativa, preservando amostras dos ecossistemas existentes na área e proporcionando oportunidades controladas para o uso do público”, como diz o decreto que o criou (1.796/1997).
Ele fica em uma região em que o Cerrado, o Pantanal e a Amazônia se encontram. Uma área de transição ambiental, onde diferentes vegetações e espécies animais interagem, dando origem a uma biodiversidade única e ainda pouco conhecida pela ciência, principalmente por falta de incentivo à pesquisa.
Na região foram identificadas 472 espécies de aves, o que equivale a aproximadamente um quarto de todas as espécies de aves identificadas no Brasil. Espécies como a Sporophila nigrorufa, popularmente conhecida como caboclinho-do-sertão, que é classificada como “vulnerável” na Lista Vermelha de Espécies Ameaçadas da International Union for Conservation of Nature (IUCN).
O local também é rico em outras espécies da fauna, entre elas mamíferos ameaçados, como a ariranha (Pteronura brasiliensis) e o tamanduá-bandeira (Myrmecophaga tridactyla), o maior dentre os tamanduás.
Apesar de toda sua importância para a biodiversidade, o parque nunca foi devidamente implementado pelo governo do Mato Grosso e suas florestas e animais sofrem com o desmatamento para abertura de pastagens.
Mais de 38 mil hectares (ha) da área que deveria estar sob a condição de proteção integral foram desmatados, dos quais quase 13 mil hectares (33%) ocorreram após a criação do Parque. No total, 24% da área do parque encontra-se desmatada. Além disso, 71% de toda sua extensão tem sobreposições com o Cadastro Ambiental Rural (CAR) e muitas destas “fazendas” produzem gado, que é vendido para mercados além dos mares, na Europa, Ásia e Oriente Médio.
*greenpeace.org